Logo cedo, a rodoviária de Goiânia estava lotada. A balbúrdia ali reinante anunciava que era Carnaval, tempo de descanso e diversão. Gente que partia e gente que chegava.

Absorto em seus pensamentos, ele cruzou a travessia entre a área de espera para o embarque e os boxes dos ônibus. Levava numa das mãos um copo de café, que sorvia espaçadamente.

Na cadência da sua caminhada, avistou três homens muito parecidos entre si e num diálogo compenetrado. Todos calçavam botas de vaqueiro empoeiradas e aguardavam o horário do embarque para os seus destinos.

Mais se aproximava dos desconhecidos, mais notava os seus olhos marejados. Parou diante dos rapazes e lhes perguntou:

– Três irmãos?

Antes mesmo de receber a resposta, discursou emocionado:

– Sejam irmãos agora, hoje, no presente. Sorriam juntos. Planejem em conjunto. Imaginem-se e experimentem-se unidos. Mas também confrontem-se. Discordem porque pensam diferente. Combinem que os conflitos têm limites e território certo. Definidas as regras e as fronteiras do desacordo, reduzirão os momentos de distanciamento para estarem sempre em companhia uns dos outros. Sejam irmãos verdadeiros. Sejam constantes no amparo e na ajuda. Sejam permanentes no cuidado mútuo.

Depois de uma pausa, o proponente da sempiterna fraternidade comoveu-se com o trio atento e sensibilizado. Aquela expressão centrada lhe era quase uma admoestação para que continuasse a falar.

Comovido por lembranças caras, continuou:

– Éramos três irmãos. Amigos, confidentes, companheiros. Sentíamos necessidade de estarmos na presença uns dos outros. Até mesmo na ausência estávamos juntos. Por conhecimento intuitivo, sabíamos impossível, fisicamente, estar juntos por toda a vida. Hoje sou um com eles… a sua presença. Perdas irreparáveis.

Suspirou com um olhar distante, como quem mira o infinito, e continuou:

– O primeiro se foi dizendo adeus num abraço apertado e prometendo o dia do reencontro. O segundo fechou os olhos sem tempo de dizer para onde e porque partia.

Retomou o fôlego e arrematou:

– A família dolorida sangrou e se refez. Aprendeu a viver de recordações. Rememorar o tempo em que os três irmãos enchiam a casa de alarido, alegria e vida. Onde estão? Sei e não sei. Carrego-os comigo convicto de que nós, os três irmãos, somos inseparáveis.

O silêncio se fez presente por alguns segundos…

Os três amigos, irmãos de laço afetivo, ouviram pensativos e emocionados. O relato profundo e sincero lhes tocou a sensibilidade.

Comovidos, abraçaram-se. O lampejo nos olhos denunciava a gratidão pela partilha da lição.

Demonstrando ter compreendido a fundo o apelo do desconhecido adventício, um dos amigos concluiu:

– Três irmãos? Não. Sete irmãos. Somos e seremos sete irmãos por toda a eternidade.

… … …

Biografia: Ana Beatriz Carvalho: Escritora brasiliense, Normalista, Professora. Educadora com especialização em Direitos Humanos e mestrado em Políticas Públicas. Sua produção literária reúne contos, microcontos, cartas, poemas e prosas poéticas. Vários de seus trabalhos foram selecionados para Antologias e Coletâneas. É membro das seguintes academias literárias: ALMUB/Brasília e AINTE/Fortaleza. Participou da 26ª Bienal Internacional do Livro de SP e da Bienal do Rio 2023 como autora. Recebeu o Prêmio Destaque Literário e Autora Revelação 2022 pela Ler Editorial e obteve o 2º lugar no X Prêmio Literário Escritor Marcelo de Oliveira Souza. Indicada para o Prêmio Ler é Legal 2023/MPDFT. Participante como autora no evento Livros em Pauta e indicada para a 2ª fase do Prêmio Strix de Literatura 2024. Premiada na categoria Melhor Biografia – I Prêmio Sapiens de Literatura Brasileira pela Editora Holandas.  Autora dos livros Contos de uma Mulher Feliz: viver para crer que tudo é bom, belo e necessário e Viva a Vida!

LEIA MAIS TEXTOS DO(A) AUTOR(A): CLIQUE AQUI

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *